quarta-feira, 15 de junho de 2016

Texto de Rute Rosas para a exposição "Regresso às origens"

Regresso às Origens 

De tradição secular e com raiz na cultura Árabe, o Azulejo, implantou-se na Península Ibérica mas desenvolveu-se, particularmente, em Portugal, expandindo-se talvez mais do que em qualquer outro país europeu, ao longo dos inúmeros períodos da História da Arte e da Cultura Ocidental.

Podemos observar inúmeros exemplares desta técnica com expressão artística em pavimentos medievais de Palácios ou Igrejas que remontam aos séculos XIII e XIV, como por exemplo na abadia de Alcobaça ou no claustro da Sé de Lisboa, mas igualmente em painéis murais, revestimentos interiores e exteriores dos mais diversos edifícios disseminados por praticamente todo o território português e que permitem viagens no tempo por mais de quinhentos anos de tradição.

No entanto, será nas soluções geometrizantes da azulejaria enxaquetada que encontramos referentes mais diretos aos trabalhos patentes nesta exposição da Sofia Beça.  

Quem conhece o seu percurso artístico dos últimos vinte anos não se irá surpreender com este Regresso às Origens.

A Sofia continua, sistematicamente, a sua dedicação à Cerâmica como ferramenta tecnológica de expressão artística. A materialização das suas inquietações ou anseios tem-se afirmado pelo apuramento, refinamento e audácia nos procedimentos técnicos com resultados plásticos diversos, seja no que diz respeito à volumetria, às dimensões ou às diferentes modalidades expositivas.

Os trabalhos mais recentes parecem apelar a uma revisitação de passados. Por um lado, a um passado histórico e cultural com tradição na azulejaria e mosaico dos últimos quinhentos anos e, por outro lado, a um passado mais recente e particular decorrente da sua experiencia vivencial.

O alto contraste na cor, tradicionalmente obtido pela utilização de engobes e vidrados, é conseguido, nestes trabalhos, pelo contraste entre pastas de cores e chamotes diferenciados cozidos em forno a lenha e que interferem nas variantes cromáticas ou de tonalidade.

A sugestão de volumetrias, de planos geométricos, de perspetiva – tão característicos da azulejaria com tradição e vocação pictórica – são transpostos para murais que sublinham os planos reais, os volumes e texturas ou para objetos isolados com relevos que acentuam e distinguem massas de dimensão diferenciada.

A racionalidade das estruturas geométricas é caracterizante destas composições de estrutura simples – vejam-se os objetos biselados e as múltiplas variantes volumétricas – e parece contrastar com a organicidade da manufaturação, da origem das matérias ou dos procedimentos utilizados. A Sofia reclama um regresso, uma revalorização do que é primário, primitivo pelo que é essência e essencial.

Decorrente de um exercício constante, diário, e que parece confundir-se com qualquer outra tarefa do quotidiano, entre a racionalidade obsessiva e a subjetividade ritmada dos procedimentos, quase catártica, Sofia Beça, expõe composições abstratas simples e com padrões repetitivos resultantes da ação incansável de um fazer, fazer, fazer… que apela ao retorno… a um passado mais ou menos longínquo mas distante…

… ao princípio.


Rute Rosas 
Maio 2016

Professora Auxiliar Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto – FBAUP
PhD Teacher
Departamento de Artes Plásticas
Artista Plástica
Escultura


www.ruterosas.com

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