50 anos, meio século, e agora? Agora que já vamos a meio caminho, e já perdemos todas as ilusões de mudar o mundo e de ser felizes para sempre? Agora, que já não temos o vigor e a energia da nossa juventude, e a nossa paciência se esgota com tudo aquilo que outrora achávamos irrelevante no mundo?
Ainda vamos a meio. E se já perdemos as nossas ilusões dos primeiros anos de vida, fiquemos então com as ilusões das ilusões. Conseguimos agora ver as coisas com mais clareza, mas isto não nos impede de continuar a sonhar. Não podemos - devemos iludir-nos frequentemente, para que tudo possa continuar a fazer sentido. Na ilusão das ilusões, tudo será melhor, se assim quisermos. Sonhamos acordados com um pé na terra e outro no céu, mas sonhamos mais alto, mais forte, à medida do nosso crescimento interior.
50 anos, ainda vamos a meio do caminho. O caminho que sempre te foi natural e com bravura e determinação escolheste. Ser ceramista, em Portugal. Poucos se lembrariam de levar isto tão a sério como tu. Mas já nasceste assim, livre, e nada te conseguiria derrubar. Neste meio caminho, deixaste um rasto indelével. O da tua obra, que fica e ultrapassa o tempo e a matéria, e o do teu filho, a tua criação suprema e sobre a qual depositas o teu futuro.
Neste caminho, nunca estiveste nem estarás sozinha. Agora que eu já não sou só irmão, mas também pai ( de dois irmãos), consigo ver nos meus filhos algo que nem sempre consegui ver. Fico frequentemente a vê-los brincar, a rir ou a chorar, e consigo ver-nos a nós, em pequenos, a fazer tudo o que eles fazem. E é tudo muito claro. Nada poderá quebrar este elo mágico, que é tão forte que transcende qualquer palavra, e que mesmo no silêncio é cúmplice para toda a vida - o amor entre irmãos.
Nos bons e maus momentos, serei sempre o caçula e estarei sempre ao teu lado nos próximos 50 anos, mesmo que nem sempre me consigas ver.
O teu irmão Gustavo
28 Março 2022